sábado, 27 de setembro de 2008

CONTO - EM NOME DOS HOMENS

Este conto foi escrito em 1991.

EM NOME DOS HOMENS

João Lucas, filho da tradicional família Feitosa de Brito, tinha amanhecido com a idéia fixa. Decididamente, depois do almoço ele deixaria o Seminário-Maior de Teologia São Jerônimo. Após passar a noite toda em claro, meditando, chegou à conclusão: “Aqui, quanto mais se reza, mais coisas erradas os seminaristas praticam”.
O Padre Reitor, recebeu a notícia da desistência vocacional de João Lucas, com imensa tristeza. Não só por perde seu melhor aluno de teologia dogmática, matéria lecionada por ele, como também por perder a alta contribuição financeira, que a rica família de João Lucas depositava mensalmente em favor do seminário. Em vão o Padre Reitor, tentou a todo custo fazer seu dileto aluno dissuadir da idéia de ir embora.
Antes do almoço, o Padre Reitor reuniu todos os seminaristas na capela, e fez o anúncio que João Lucas estava deixando o seminário. O seminarista Vidal, ficou em pranto, pois era ele quem ganhava as roupas e sapatos de João Lucas, quando não mais queria usá-los. Chorou copiosamente. Fizeram uma fila, para que cada seminarista se despedisse, dando um abraço em João Lucas. Primeiro a abraçar foi o Padre Reitor, que fez uma declaração ao pé-de-ouvido do já ex-seminarista: ___ Você tinha tudo para ser um bispo. É inteligente e sua família tem posses.
Enquanto recebia os braços e cumprimentos, João Lucas lembrou do muito que apontou durante os quase seis anos vividos naquele seminário. Os votos: castidade, pobreza e obediência, ele nunca os viveu. Quando cursava o 3º ano de Filosofia, João Lucas e outro seminarista foram para á Praça Fausto Cardoso, reduto de meretrizes e michês, lá sentiram pela primeira vez o gozo, proporcionando pelas experimentadas mulheres de “vida fácil”. Pecando assim, contra o voto de castidade. O outro seminarista, que acompanhou João Lucas na noitada de prazeres carnais, foi julgado, condenado e expulso do seminário, sem direito de defesa, já João Lucas somente recebeu orientação do Padre Espiritual, para não mais cair em tentação. A luxúria era o forte de João Lucas, tinha ele seu próprio carro no seminário, usava só roupa de marcas e esbanjava a gorda mesada, que ganhava dos pais, comprando coisas supérfluas e freqüentando restaurantes de cardápios caros. Pecando assim, contra o voto da pobreza. Certa vez, Caetano Veloso, veio fazer um show na cidade, sendo João Lucas fã incondicional do cantor e compositor baiano, ele não mediu esforços para ver seu ídolo de perto. Depois de ser proibido de sair do seminário naquele dia, pelo Padre Reitor, contrariando as ordens do seu superior, não houve outro jeito, se não o de João Lucas pular o muro de cinco metros do seminário, para assistir ao show do autor de “Podres Poderes”. Pecando assim, contra o voto da obediência.
Tudo estava consumado. Alguns seminaristas ajudaram carregar as malas até o carro de João Lucas, que sem olhar pra trás, saiu em alta velocidade.
Quando chegou a casa dos pais, explicou o porquê da sua decisão de abandonar o seminário:

___ Lá é um lugar que tanto forma, como deforma.
Disse isso cabisbaixo. O pai de João Lucas lhe deu todo apoio, a mãe mostrou descontentamento com o acontecido. Tinha ela muito orgulho em dizer para as amigas, que seu filho era seminarista. Teólogo!
Aproveitou a reunião familiar e comunicou que iria morar no Rio de Janeiro, no apartamento da família, na Rua Marquês de Olinda, em Botafogo. Queria João Lucas investir na sua nova vocação, a de roteirista. Argumentou com os pais:
___ Nasci para escrever roteiros para cinema, é minha verdadeira vocação. Sou um homem para as letras, não para o altar.
E mostrou aos pais a sinopse de um filme de sua autoria, intitulado: Em nome dos Homens:
___ O filme tem como plot principal, a história de um padre que assume a homossexualidade durante a homilia, na missa de domingo!
Enfatizou João Lucas Feitosa de Brito.